O que é o espírito de Babilônia?
Não podemos responder a esta pergunta sem conhecer a história e a geografia bíblicas. Isso mesmo! Há quem torça o nariz para estas duas matérias fundamentais para a compreensão da Palavra de Deus, assim se perde uma excelente oportunidade de aprendizado. Afinal, tudo que está escrito, para nosso ensino foi escrito (Rm 15:4).
Babilônia é o berço da civilização. A região abrigou o Éden e as primeiras cidades (Gn 4:17) e, portanto, as primeiras formas de organização social e política: as civilizações! O jardim original ficava entre quatro rios: Pison, Giom, Tigre e Eufrates (Gn 2:10-14). O Pison e o Giom nunca puderam ser corretamente identificados, até porque a geografia local mudou ao longo tempo (Gn 10:25). Já a região entre o Tigre e o Eufrates é conhecida como Mesopotâmia. O termo vem de μέσος, (lê-se, mesos), meio, entre dois referenciais, e ποταμός, (lê-se, potamós), rio.
Foi naquela região que surgiu a primeira insurreição contra Deus: Babel (Gn 11:9). Ora, בָּבֶל (lê-se, bavel), que, por sinal, é o nome arcaico de Babilônia, significa, confusão, mistura (vem do verbo בָּלַל, lê-se, balal). Babel era um projeto que visava elevar o homem. Talvez, a segunda iniciativa antropocêntrica da História. A primeira foi a sugestão da serpente: “Sereis como Deus!” (Gn 3:5). Desta forma, Babilônia despontou desde o início como um propósito de oposição ao Criador.
Um ressalva importante é que embora, na enumeração das potências mundiais, Babilônia figure em terceiro lugar (Assíria, Egito, Babilônia, Pérsia, Grécia, Roma), a cidade existiu desde sempre, sendo preponderante de forma alternada com as demais potências do Mundo Antigo. Inclusive, após ser conquistada por Ciro manteve seu nível de importância. O que aconteceu do ponto de vista histórico é que tais nações acumulavam poder e expandiam seus territórios, para serem, então, conquistadas, vencidas e, em seguida, reduzidas.
Assim, em Babilônia surgiram as formas primitivas de idolatria. Ora, em sua essência a idolatria consiste em um deus moldado pelo homem, o qual se confunde com o adorador. Outrossim, a arqueologia dá conta que Babilônia também era politeísta, uma degeneração da adoração monoteísta. Importante notar que havia um intercâmbio de deuses com outras nações como os sumérios, assírios e egípcios, os primeiros ecos do ecumenismo.
Alguns dos deuses de Babilônia:
- Marduk (rei dos deuses, o mais importante no panteão babilônico). Era também chamado de Bel, que significa senhor. Estava associado à água, ao julgamento e à vegetação. Os babilônicos acreditavam que era Marduk o responsável pela escolha do rei da Babilônia, daí porque muitos nomes de reis e príncipes incluam a partícula bel a exemplo de Belsazar. Havia também a variante Merodaque (Is 39:1);
- Apsu – o progenitor dos deuses. Esposo de Tiamat. Personificava a água do solo primordial;
- Tiamat – deusa primordial, mãe do cosmos. Representava às águas dos oceanos;
- Samas ou Chamache – deus do sol e da justiça;
- Enki – deus das águas doces dos rios e lagos. Era também associado ao conhecimento;
- Anu – deus dos espíritos, dos demônios e das constelações estelares. Era considerado também o juiz dos deuses e dos homens;
- Nabu ou Nebo – deus da escrita e da sabedoria;
- Ishtar (Inana): deusa da guerra, da fertilidade e do amor.
A religião de Babilônia era sincrética e mística, consultavam o fígado dos animais sacrificados para seus presságios (Ez 21:21). Eram adoradores dos astros. Os babilônios foram os primeiros a associar os mitos às constelações e descrever os doze signos do zodíaco. Com seus conhecimentos de astrologia foram capazes de determinar a posição de alguns planetas e estrelas visíveis a olho nu. A intenção, a priori, não era científica, mas prever catástrofes determinadas pelos deuses.
Por outro lado, esse comportamento nos deixar transparecer um aspecto animista das crenças babilônias, pois atribuíam poder aos astros e outros eventos da natureza.
O sistema babilônico de adoração ainda tinha espaço para o misticismo. Intérpretes de sonhos ocupavam posição de destaque. Na mística babilônica acreditava-se que os deuses enviavam avisos através deles. Foi isso que assustou Nabucodonozor (Dn 4:5-7). Note que este grupo de místicos era grande e diversificado.
Foi em Babilônia que floresceu o humanismo. Os reis babilônios eram poderosos e cruéis. A cidade era imponente. Tal poder tornava os soberanos autossuficientes e orgulhosos. Conquistavam os povos ao redor e lhes impunha sua cultura e religião, num claro sinal de endosso à globalização. Seus reis viviam entregues à luxúria e aos banquetes (Dn 5:1-12), dando a tudo isso a aparência de legalidade e devoção.
Pintura retrata a provável configuração da cidade de Babilônia
A suntuosidade era cultuada em Babilônia. Nabucodonozor, um de seus maiores reis, construiu-lhe um palácio rodeado de jardins suspensos, que eram tidos como uma das sete maravilhas do mundo antigo. Este adorno impressionava o viajante e traduzia orgulho, imponência e jactância. A cidade concentrava a riqueza de seu tempo, seja no investimento público, no financiamento vultuoso de campanhas militares, no tesouro dos reis ou sob qualquer outro ângulo.
Provável configuração dos jardins suspensos de Babilônia
Curiosamente, Babilônia era uma cidade frágil. Conta a história que para conquistá-la, no dia em que Deus decretou o fim do reinado de Belsazar (Dn 5:29-31), por volta de 539 a.C., Ciro, rei da Pérsia, com seu comandante, Dario, o medo, tomou a providência de desviar o curso do rio que a atravessava e a acessou com seu exército. Os soldados estavam tão bêbados que não puderam reagir.
É esse pois o resumo do espírito de Babilônia. Sua religião não agrada a Deus, pois é centralizada no controle humano. É mística, ecumênica, sincrética, antropocêntrica, animista e desviada da verdade. Síntese de tudo quanto desagrada o Criador! Por outro lado, é capaz de se metamorfosear e de uma hora para outra surgir com nova roupagem enganando os incautos. Somente pessoas de profundo conhecimento de Deus são capazes de sobreviver nesse ambiente infestado de toda forma de pecado.
É o que aconteceu com Daniel. Desde bem cedo o jovem príncipe percebeu que o poder é efêmero, que os reis e a glória dos reinos passam e só aqueles que fazem a vontade de Deus permanecem para sempre (1 Jo 2:17). O profeta torna-se, para nós, um símbolo de que é possível permanecer firme e incorruptível num mundo dominado pelo perverso espírito de Babilônia.
Este espírito, porém, é tão infectante e resistente que perdura até o fim dos tempos. Em Apocalipse é referido nada menos que seis vezes (14:8; 16:19; 17:5; 18:2,10,21), sempre num contexto de julgamento. É o espírito que será subjugado no fim dos tempos, quando aquele que o inspira também será derrotado em definitivo.
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